terça-feira, 23 de outubro de 2007

100 cedilhas?

(Atenção! Texto longo e potencialmente aborrecido, leia na diagonal!)

A cedilha é aquilo a que os brasileiros chamam, por vezes, “o rabinho do c”. Nós felizmente não temos essa mania mas temos outras igualmente desagradáveis. Em rigor, a cedilha - do castelhano cedilla, «pequeno z» - é, como toda a gente sabe, aquele sinal diacrítico que se coloca sob a letra "c" para lhe dar o valor de "s" inicial.
Resumindo um pouco a história, a cedilha surgiu quando os castelhanos - em pleno obscurantismo medievo, naquele tempo em que os Papas podiam ter concubinas - acharam que o alfabeto vigente era limitado e decidiram inventar este sinal inspirado na escrita gótica… A verdade é que a coisa fez furor e os portugueses, os franceses, os catalães, etc., acharam aquilo de uma extravagância deliciosa e copiaram. Mais tarde os castelhanos perceberam que afinal a coisa era estúpida e redundante e acabaram com ela. Mas o mal já estava feito e a cedilha ficou agarrada como uma lapa à grafia da nossa língua, de tal modo que seria, hoje em dia, para nós impensável a vida sem cedilhas. Ainda que, no fundo, seja apenas uma questão de “status”, isto é, a cedilha e os dois “s” (ss) soam exactamente da mesma maneira mas a cedilha tem, inegavelmente, muito mais charme.
Posso agora falar-vos ainda, um pouco, do insólito caso de também os turcos e os romenos, entre outros, usarem cedilhas, nomeadamente para escrever… mas não quero. É engraçada a coisa das cedilhas debaixo de outras letras mas também não é nada assim de tão interessante.

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“uma cedilha” (para os mais distraídos e que ainda não perceberam do que estou a falar)

Entretanto, na história da cedilha, tudo corria bem até à invenção dos computadores e, por fim, da internet. Nunca como hoje a cedilha foi tão desrespeitada e marginalizada!
Um dos desafios do mundo digital actual é a correcta representação, não só da cedilha mas de todos os sinais diacríticos. Isto acontece porque em virtude de uma, ainda comum, falta de padronização na forma de codificar este tipo de caracteres, é frequente ocorrerem falhas e erros nos programas e para evitar isso o método mais simples e mais comum é, pura e simplesmente, a não utilização destes sinais. Toda a gente se lembra do que acontecia até há bem pouco tempo com o tão popular hi5, por exemplo.
Tudo isto está relacionado, nomeadamente, com o padrão Unicode e as diversas sub-codificações e também com o uso de várias “fonts” diferentes e eu podia naturalmente debitar-vos aqui conhecimento enciclopédico profundo e enriquecido com notas de rodapé exaustivas sobre o assunto… se soubesse alguma coisa disso mas não é o caso.

Na prática, uma das consequências mais aborrecidas de tudo isto é quando se dá o caso de o indivíduo possuir um sinal desse tipo no próprio nome e a sua não representação alterar a sua pronúncia. Por exemplo, supondo que alguém tivesse um improvável nome como Gonçalo Gonçalves, eu diria até que se via, inclusivamente, quase como que privado da sua identidade! Após anos a fio a viver como Goncalo Goncalves (repare na ausência das cedilhas, não se deixe iludir pelos automatismos cerebrais), seria até de supor que já respondesse a esta segunda versão como se fosse a correcta, nomeadamente, se, por exemplo, alguém o interpelasse na rua chamando: “Ó Goncalo!”. Eu próprio vejo-me invariavelmente privado do meu “rabinho do c” e não passo de um “Colaco” no mundo digital…

O blog “100 cedilhas?” podia então ser um grito de guerra contra os inúmeros vilipêndios e ataques à dignidade das cedilhas!!! Mas não é. Nem é sequer uma chamada de atenção, é antes assim uma constatação e um encolher de ombros resignado e “um esperar que isto melhore” tipicamente “tuga”…
Em todo o caso, fica aqui (na coluna lateral do blog) um repositório simbólico de 100 cedilhas assim como que, vá lá, um epitáfio de um cenotáfio erigido (ou redigido, neste caso) em memória de todas as cedilhas privadas do seu direito à vida e da sua liberdade de expressão (o que para elas é, por inerência das funções, a mesma coisa) pelas alegadas “dificuldades de codificação” nas linguagens do meio virtual.

Um comentário:

nattyrebel disse...

Hi! i have been tripinp ln your blog and i loved! i will come over and over again if you never mind about it.
Vim só porque vi o meu nome num dos teus comentários no moscatel e não percebi mesmo quase nada mas ok.
tens um blog muito sugestivo e gostei já percebi que gostas de fotografia tal como eu embora não eu não seja fotografo nem tenha nenhum curso mas vou aprendendo com este tipo de blog.-
fica aí aquele abraço.