domingo, 25 de novembro de 2007

Eufemismos arquitectónicos

Passei ontem de carro em frente a uma Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR), numa cidade dos arredores de Lisboa. Como estava trânsito tive oportunidade de contemplar, bem como inalar, ao pormenor as instalações desta estação que tem como função filtrar e tratar os esgotos de quase toda a região antes de lançar no rio as águas derivadas desse mesmo processo. Agora, o que me causou estranheza foi o facto de todo o recinto estar povoado de exóticas palmeiras… Esses caprichos arbóreos de caule cilíndrico não ramificado que tanto gostamos de importar para efeitos arquitectónicos decorativos são, embora atípicos do nosso território, muito comuns nas chamadas zonas balneares… realmente é um facto que uma ETAR tem algumas piscinas mas… não creio que alguém faça uso delas para qualquer tipo de actividade recreativa ou de lazer.
Não deixa nunca de me surpreender esta mania cultural dos eufemismos. Por exemplo, um homem quase que fica com pena de lhe ser negado por natureza esse prazer exclusivo quando vê aquela alegria pululante das raparigas menstruadas dos anúncios de pensos higiénicos… É formidável como todos estes expedientes de cosmética social, com que convivemos a todo o momento, conseguem ser, por vezes, tão criativos como ridículos. Na minha modesta opinião uma ETAR não tem de ser bela e atraente! Mas então reconheço que entramos numa discussão parva e inconsequente porque me podem responder no mesmo tom que também não tem de ser feia e aí eu encolho os ombros e sou obrigado a não discordar.
Metam as palmeiras nas ETAR se quiserem, desde que depois não vá ninguém por ali adentro ao engano, de chinelos e toalha ao ombro, como quem caminha distraidamente pelo resort à sombra refrescante do palmeiral, em direcção àquelas piscinas redondas…

sábado, 24 de novembro de 2007

Saudades tuas meu amigo...

(para todos os que sentem a falta do nosso querido André Romeiras...)

Faz hoje um ano que partiste...
Não acredito em reencontros póstumos, por isso este post, em tua memória, é dedicado a todos os que também sofreram com a tua partida e sentem a tua falta. Dirijo-me a ti directamente, contudo, porque não faria sentido de outra forma e porque... talvez eu esteja enganado.

Recordar aquelas pequenas coisas como o teu o largo sorriso de dentes perfeitamente alinhados... o tão típico ajeitar dos óculos... aquele franzir do sobrolho que fazias de forma tão característica... uma gargalhada daquelas tuas inimitáveis...
Recordar...
[...]
Pensar que as tuas cinzas se possam ter espalhado pelos quatro cantos do mundo...
Enfim...

Lembrar o teu exemplo, lembrar os teus conselhos...
E continuar

terça-feira, 20 de novembro de 2007

"What the hell happened to you anyway...? You look like forty miles of rough road!"

"Trav? Do you mind tellin’ me where you did disappear to for the last four years?"

Deixo-vos a sugestão de deambularem mentalmente pelo Deserto Mojave, por uns instantes, com este som:


(Ry Cooder - Paris, Texas)

(Vejam o filme Paris, Texas de Wim Wenders se ainda não o viram. Admito que possa haver discussão sobre até que ponto é um bom filme mas é, sem dúvida, um filme lindo.)

domingo, 18 de novembro de 2007

“O vizinho anti-tabágico” ou “Neighbour of the beast” (ainda não escolhi)

Em termos de campanhas contra o tabagismo, para prevenir ou para abandonar o vício, se há coisa que resulta comigo não são os avisos alarmantes nos maços de tabaco; não são os convincentes anúncios, financiados pela UE, de sujeitos a soprar artefactos carnavalescos; não é a publicidade das curas milagrosas que frisa sempre os aspectos negativos com palavras-chave a bold como "IMPOTÊNCIA", "EJACULAÇÃO PRECOCE" (e até outras ainda mais desagradáveis mas, por vezes, ironicamente, menos persuasivas); não é a imparável escalada de preços do maço de tabaco… nada disso.

O que resulta mesmo comigo são os ataques de tosse nocturnos do meu vizinho do lado... Meu Deus, aquele ribombar cavernoso de brônquios faz-me sempre sentir que vivo paredes-meias com o Balrog das Minas de Moria! Desconfio que, por vezes, quando ele ribomba e estrondeia até perco duas ou três gotinhas com o medo... e volta, não volta lá dou por mim de lanterna a apontar para a parede à procura de danos estruturais irreversíveis...

Um sonho pouco verosímil

Dei por mim esta noite a descer a Av. dos Combatentes em direcção à Praça de Espanha. Tudo isto até podia ser perfeitamente normal não fosse o facto de estar a fazer esse percurso a alta velocidade, no "picanço" com o meu irmão mais velho, ambos montados nas velhas bicicletas BMX da nossa adolescência… Pior foi o facto de termos passado os semáforos todos a vermelho sempre a acelerar em direcção à Av. Calouste Goulbenkian…
Depois acordei e ainda fiquei por alguns segundos preocupado com a possibilidade de haver talvez em mim adormecido um potencial assassino ao volante... (ou neste caso ao guiador).

quinta-feira, 15 de novembro de 2007

Qualquer dia até as Páginas Amarelas me põem no limpa pára-brisas do carro...

Uma revista em formato A4, com mais de 20 páginas de promoção de uma agência de viagens, era o que me esperava hoje preso ao limpa pára-brisas! Longe vão os saudosos tempos dos pequenos papelinhos a anunciar os serviços do Professor Karamba, ou mesmo aquelas folhinhas coloridas com menus de restaurantes chineses (por vezes até com cardápios completos mas sem a morada do estabelecimento) que até serviam amiúde para subtrair à pintura uma ou outra dejecção de pombo precipitada, ou para, num vislumbre, aferir da evolução da integração destes imigrantes orientais nos meandros linguísticos da lusofonia. Hoje em dia, contudo, este tipo de aparato publicitário já começa a ser de formato A4 para cima, assim a ocupar metade do vidro. Cheguei à conclusão que, na prática, com as alterações climatéricas, actualmente gasto mais as borrachas dos limpa pára-brisas com publicidade indesejada do que com a chuva propriamente dita.

Entretanto, na minha ingenuidade, esta tarde ao aproximar-me do carro e deparar-me com o almanaque da agência de viagens, primeiro ainda me passou pela cabeça que pudesse ser assim um convite mais original para um passeio diferente e logo folheei a revista à procura de uma bola a marcador cor-de-rosa à volta de uma foto paradisíaca acompanhada de um sugestivo “Vamos?”… até reparar que todos os outros veículos tinham também o mesmo exemplar, incluindo aquele velho Austin abandonado e já sem rodas… (já me perguntei o que passará pela cabeça de quem se lembra de colocar publicidade num carro assim…).
E quando percebi irritado que afinal estava simplesmente a ser vítima do mais ordinário marketing directo, atirei, num gesto rude, o folheto para o… banco de trás. Não consigo. Não consigo aculturar-me àquele gesto tão típico de atirar o lixo para o chão, reconheço a minha falha… Parece que há qualquer coisa de estrangeiro em mim que não consigo extirpar.

terça-feira, 13 de novembro de 2007

GMT -07:00 para GMT

(Atenção! Post umbiguista)

Preciso de viajar através de sete fusos horários sem sair do mesmo sítio. Ainda nem são 18h e já é noite! Desde que mudou a hora que a minha vida se tornou muito mais sombria. Se alguém agora se deitar às 7 da manhã e acordar às 15h praticamente não vê o Sol, é quase como viver o fenómeno da Noite Polar mas em latitudes onde isso é, no mínimo, improvável.
Nem eu entendo esta coisa de viver sete fusos horários atrasado em relação ao sítio onde estou. A diferença não era tão grande mas com o tempo foi piorando e agora tornou-se incomportável. Em todo o caso, em breve terei de arranjar um novo emprego, até porque a “indemnização choruda” não vai durar muito, e desta vez quero tentar ter um horário normal. Mas não sei bem como fazer essa mudança súbita sem sofrer imenso com o jet lag implicado. O mais engraçado é pensar que se agora viajasse para o México não teria qualquer problema de jet lag! Se calhar devia antes procurar emprego por lá… Mazatlán, na costa do Pacífico, por qué no…? Afinal, aquele velho sonho de vender águas de coco na praia… Ou então, a alternativa é ficar cá mas arranjar amigos e amigas lá. Hoje em dia é perfeitamente viável… “Procuram-se amigos localizados em GMT -7”.

Photo Sharing and Video Hosting at Photobucket
(c) Carlos Colaço 2007

“Isso não é vida para ninguém!”, lembro-me de ouvir dizer alguém, a quem deveria eventualmente maior respeito, referindo-se aos meus horários heterodoxos. Não partilho dessa concepção mas, em todo o caso, admito que se o excesso de Sol pode ser prejudicial, o excesso de Lua também não é nada bom deixando-nos mesmo com uma cor pálida, pouco saudável.
Quando oiço falar do fascínio da vida nocturna rio-me por dentro como quem já percebeu que está a ser enganado mas deixa prosseguir a mentira. Tem um andamento viscoso muito próprio, a noite. Tudo passa muito mais devagar, menos o tempo. Faz-se demorar a noite e no entanto, quando se dá por isso já são 2:00, já são 4:00, 6:00… À noite todos metem conversa, como que por medo do silêncio. Do silêncio do outro, do silêncio próprio, do silêncio. Luzes amarelas iluminam avenidas inteiras de vazio e desassombram incontáveis ruas desalmadas. Os semáforos impõem-se rectos para ninguém, como actores teatrais nos ensaios clamando a plateias vazias. Até se aproximar um carro, que até pode ser azul escuro, ou verde escuro ou se calhar é mesmo preto mas a esta hora tanto faz, e através dos reflexos do vidro consegue-se distinguir um rosto a sorrir e um encolher de ombros resignado à intransigência do semáforo vermelho que o obriga a parar, para ver passar ninguém. Entretanto há outro anónimo que se aproxima deste e lhe pede um cigarro e há uma prostituta que lhe oferece lume e, antes de acender o verde, dá ainda tempo para fazer um zapping ao rádio, povoado daquelas vozes roucas e pausadas onde se ouve no timbre o quanto custa em cigarros o passar das horas escuras. E logo arranca, o carro quase vazio, transportando a mesma solidão da sessão da meia-noite em dia a semana... E há também o outro zapping, em círculo infindável, entre compactos, reposições e repetições, numa televisão com a qual é quase possível viver em união de facto, noite após noite.
À noite cada hora é uma repetição das anteriores até à alvorada… E depois ao amanhecer é ver os vespertinos a fugir da luz como vampiros e a recolher ansiosamente aos aposentos, como se ver o Sol provocasse danos irreparáveis no tão aguardado sono.


Smashing Pumpkins – We only come out at night

Mas sinto imenso a falta do sol da manhã… A maior parte das pessoas não se aperceberá, tal é a banalidade, mas para mim é sempre deslumbrante ver as cores e a incidência da luz da manhã… as ruas, os prédios, os rostos, o Tejo, tudo fica completamente diferente…
Preciso de viajar através de sete fusos horários sem sair do mesmo sítio.
Parece mesmo que vou fazer uma espécie de longa viagem. E enfim… depois, quando der por mim a bocejar tremendamente à meia-noite, sei que me vou aperceber com um sorriso que voltei a fazer parte do formigueiro corredio de onde me sinto extraviado…

domingo, 11 de novembro de 2007

Godspeed!

(Para aquela minha amiga bióloga que vai, mais uma vez, passar um mês de auscultadores nos ouvidos a escutar cetáceos, num barco, ao largo de um país gelado)

O teu irrequieto pin no meu Google Earth vai ser temporariamente movido para dentro de água. Escolhe sempre destinos inóspitos este pin mas pelo menos desta vez não é o Alasca. Inóspito por inóspito bem que ele podia passar por Portugal mais vezes, não?

Aquela notícia de ontem relativa a terem fechado várias plataformas petrolíferas ao largo da Noruega por questões de segurança, devido às terríveis condições climatéricas e ao estado do mar, era coisa para me poder preocupar um bocado tendo em conta que estás a viajar para lá mas, pensando bem, afinal aqueles roughnecks e roustabouts que passam mais de metade do ano fechados em plataformas geladas são umas florzinhas ao pé dos “toughs” dos biólogos marinhos, é natural que eles tenham de ser evacuados de helicóptero do sítio para onde vocês vão com tranquilidade…

Olha, espero que corra tudo bem e que concretizes todos os objectivos da viagem e aproveito para deixar aqui uma musiquinha para celebrar a expedição:


Colleen - The Happy Sea

Musicalmente é horrível, eu sei. Mas como não faço ideia como são “as coisas” que ouves pelos auscultadores imagino sempre que é qualquer coisa deste género, assim muito etéreo e com muita inspiração (provavelmente de várias substâncias ilícitas). E depois não consegui resistir ao nome “the happy sea”, mesmo parecendo demasiado forçado.

E olha, mergulhos é só quando a água estiver a temperaturas positivas senão faz dói-dói!

Até já! ;)

A música que tem passado em repeat

Post a estrear a rubrica a música que tem passado em repeat, (claramente e declaradamente inspirada no programa “Em Repeat” da Rádio Radar mas com um nome menos bem conseguido), a nova rubrica de propostas musicais deste blog. O critério de escolha é simples, sugiro simplesmente a música que ando a ouvir compulsivamente, excessivamente e obsessivamente em “repeat”.
Actualmente estou a precisar de me desintoxicar desta:


Editors – An End Has A Start

Mas que som!!!
(Servir bem alto e agitar depois de abrir…)

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Ladies first?

Sugestão de adaptação de uma norma de etiqueta à regulamentação do tráfego rodoviário através de nova sinalética vertical.
(Em todo o caso, tenho para mim que as feministas iriam boicotar a medida recusando avançar e, com isso, provocariam o caos no trânsito. Não fosse isso e esta proposta teria, naturalmente, tudo para ser praticável…)


(imagem em tamanho normal no meu fotoblog katadioptriké)




(c) Carlos Colaço 2007

sábado, 3 de novembro de 2007

All Saints

(desambiguação - este post é sobre o Dia de Todos os Santos, ou All Saints’ Day em inglês, se procura informações sobre a, sem dúvida não menos interessante, girlsband chamada All Saints prossiga antes por este link, levando consigo, naturalmente, os meus votos para uma vida feliz.)

Passaram, estes dias, algumas efemérides dignas de registo, nomeadamente o Dia de Todos os Santos.
D. José Policarpo ter-se-á mais uma vez interrogado, sem grande apoquentação, até quando se conseguirá manter o embuste de ter feriados religiosos católicos num estado, alegadamente, laico. José Sócrates terá provavelmente desabafado com Vieira da Silva: “Acabar de vez com estes feriados religiosos é que era porreiro pá…”. Várias teenagers americanas ter-se-ão questionado indignadas porque é que as All Saints têm direito a um feriado a as Spice Girls não. Incontáveis franceses terão exercitado vários músculos do rosto ao apertar os lábios o suficiente para conseguir dizer “Toussaint”, o nome que eles dão ao dia em causa. Muitos portugueses não saberão que feriado é esse do “1 de Novembro” e a esmagadora maioria dos que sabem nomear a efeméride não saberiam explicá-la ou sequer defini-la.
Tem vários aspectos no mínimo curiosos, este Dia de Todos os Santos. Remeto para blogs da “especialidade” uma explicitação rigorosa e em detalhe. A mim, uma das vertentes que, não sendo porventura a mais relevante, me parece fascinante, é o facto de ser o dia em que, um pouco ao estilo Samsung "Everyone's Invited", a Igreja convida todo o indivíduo a levar uma vida santa. Admito que esse convite de certo modo me intriga. Por um lado, mesmo acreditando que as pessoas tenham, de um modo geral, uma ideia mais ou menos comum de “Bem”, creio que actualmente a Igreja terá tantas definições de “vida santa” quanto o número de sacerdotes e julgo que teria até de haver um novo concílio, inteiramente dedicado ao tema, para que, em rigor, este convite tivesse um significado praticável. Pergunto-me, por outro lado, sem sarcasmo, se não é redundante haver um dia específico para fazer um convite que está implícito na própria doutrina da Igreja?

Entretanto passou-se também o Halloween e o Dia dos Fiéis Defuntos. A pensar no aprovisionamento para um futuro eventualmente mais infértil, reservo um comentário a esses dias para Novembro de 2008 e de 2009 respectivamente…